O MUNDO DAS CRIANÇAS SÓ É POSSIVEL POR CAUSA DO MUNDO DOS ADULTOS
Provavelmente sempre foi difícil crescer, de uma forma ou de outra. Profundamente ancorado na nossa psiquê provavelmente está um desejo universal de regressar a vida sem preocupações da infância.
Na verdade, amadurecer sempre foi um desafio, mas acredito que nunca foi algo tão difícil quanto é agora no nosso mundo moderno. Nossa cultura popular é construída em torno dos gostos dos jovens, hoje colocamos a juventude num pedestal e consequentemente, muitos jovens parecem presos no limbo — não são mais crianças, mas também não são adultos plenos.
Ao discutir um assunto como esse, é difícil não cair na rabugice, no estilo “essas crianças de hoje em dia…”. Mas vou tentar resistir a essa tentação
Eu pessoalmente senti esse peso em minha vida quando tentava escapar do puxão gravitacional da adolescência e me propulsionar para a vida adulta. Só foi depois que eu me dei conta que não houve nada de especial nessa minha escalada; às vezes me pego pensando no ensino médio e digo "Cara, aquilo foi divertido”; e há momentos em que olhando para o meu filho mais novo tenho aquele desejo de ser criança novamente, de ir dormir sem nenhuma preocupação e de ter alguém que cuida de tudo pra mim.
Ser um adulto, apesar de bastante satisfatório, é realmente difícil algumas vezes. Eu, portanto, não tenho muita simpatia por aqueles que falam para os jovens pararem de reclamar de barriga cheia e crescerem de uma vez, como se fosse a coisa mais fácil do mundo, e que jovens adultos que estão com dificuldade são apenas fracotes sem disciplina ou motivação.
Mas, ao mesmo tempo, também não tenho simpatia para aqueles que falam “Bem, se ser crescido é tão difícil de se realizar, vamos só dispensar a ideia de uma vez. Vamos nos divertir! Fazer o que quisermos! A vida adulta é para otários que compraram a mentira!”
Mas o que esses depreciadores da vida adulta não entendem é que o mundo das crianças só é possível por causa do mundo dos adultos.
Isso é super importante, então me permita repetir: o mundo das crianças só é possível por causa do mundo dos adultos.
Quando as pessoas se negam a crescer, o que elas não se tocam é que elas mesmos não querem ser adultas, mas querem viver num mundo onde todas as outras pessoas são. Elas querem políticos competentes e efetivos representando-as; querem jornalistas e médicos espertos e sensatos com uma personalidade ética reconfortante; querem que os professores de seus filhos sejam dedicados e atentos; querem que o atendimento ao consumidor seja amigável e eficiente; querem que os policiais sejam honestos e justos. Elas querem que o mundo seja estável, previsível… para que possam ser erráticos e irresponsáveis. Elas querem ser crianças, mas vivendo em um mundo adulto, onde pessoas responsáveis estão prontas para cuidar de cada uma de suas necessidades.
Desde que os resistentes à vida adulta sejam uma minoria — “rebeldes” na periferia —, o mundo continua a rodar. Mas se pretensos adultos o suficiente aderirem a esse discurso, e não haja mãos firmes o suficiente no volante, o resultado é uma escorregada para uma sociedade cada vez mais alienada. Isso não é uma profecia sobre um futuro muito distante, ou um argumento no estilo “faça pelas crianças” (crianças que muitos resistentes à maioridade nem querem ter), mas algo que está acontecendo agora. Ainda há mais adultos do que adultos-crianças, mas os números destes últimos estão aumentando. O Congresso é quase que inteiramente formado por adultos-crianças que não conseguem realizar uma coisa sequer. Programas de notícias parecem auditórios do ensino médio — um bando de palhaços que estão ali buscando o melhor comentário sarcástico ou espertinho e parecer o mais descolado. Há professores que dormem com seus alunos e cujos currículos tem como principal habilidade mostrar vídeos; há policiais que atiram antes e perguntam depois; há médicos que só fazem diagnósticos superficiais e indiferentes e pedem uma série de exames errados. E usar o atendimento ao consumidor em qualquer área significa ser confrontado com uma incompetência causadora de traumas em cada etapa.
Em cada esfera da sociedade, alguém tem que lidar com o choro infantil do “Você não é o meu chefe! Você não pode me dizer o que fazer!”, então tudo é feito com o menor esforço possível (se isso). E se esses rebeldes você-não-é-meu-chefe tem alguém trabalhando para eles, ou ajudando eles, eles esperam ter o melhor serviço, da mais alta qualidade possível. Na vida real é assim: todo mundo quer pegar da caixinha da sociedade, mas ninguém quer contribuir.
Quanto mais adultos houver na residência, melhor para todos. Mas o argumento para a maioridade não precisa ser um que apele para o autossacrifício, mas sim um que se apoie no interesse próprio. Permanecer uma criança para sempre só funciona se você é o único fazendo isso e pode depender do mundo dos adultos para tomar conta de você. Mas num mundo só com crianças, em que a civilização se desmorona, você não vai ter nenhuma escolha — você vai ser obrigado a crescer, e a vida adulta nesse cenário será destituída de muitas de suas satisfações.
Mesmo que você esteja convencido de que o mundo precise de adultos, você ainda pode ter a vontade de não crescer. Afinal de contas, quem quer se tornar desinteressante, tedioso, cauteloso e nada divertido como propagam que é o "mundo dos adultos"? É mentira, podemos ser adultos sem perder o espírito de criança e a alegria de viver.
Enfim, é cada vez mais impossível sair pela porta de casa e não se deparar com os reflexos que a cultura do "mundo das crianças" acaba ocasionando: adultos desregrados, infantis, inconsequentes e em busca de prazeres frouxos e nada construtivos. Sei que cada um sabe o que faz de sua própria vida e "onde o sapato aperta", mas é um tanto difícil observar pessoas cada vez mais dependentes em todos âmbitos possíveis (emocional e material sendo campeões).
Não que um "genuíno adulto" seja 100% impenetrável à atitudes do tipo, longe disso. Contudo, pessoalmente, creio que o fundamental é ter o desejo (e a disciplina) de sempre caminhar para a independência, a autodeterminação consciente e saudável: a maturidade. Errar (sim, por favor), mas não persistir no erro (não, jamais). Porque, afinal, o mundo precisa de adultos.