PELA COMPLEXIDADE SOCIAL A POLÍCIA É INDISPENSÁVEL MESMO EM UMA HIPOTÉTICA SOCIEDADE CIVILIZADA
O que tá rolando no Espírito Santo é o caos, mas o que mais me chamou a atenção foi a quantidade de "ladrões de oportunidade" que surgiu em meio ao caos. Pessoas que normalmente andam na linha, mas que ao verem as portas das lojas arrombadas entraram e roubaram tudo o que puderam. É impressionante a quantidade de gente que precisa, mesmo, ser mantida sob ameaça (de prisão, de ir para o inferno que seja) pra não fazer a coisa errada.
Tem um discurso que diz que onde há civilidade, a polícia não é indispensável ou se faz em absoluto necessária, que não deixamos de matar, roubar ou estuprar porque não tem policial olhando, que deixamos de fazer isso porque é imoral, porque é uma ofensa aos direitos de outras pessoas. Então, nesses contextos de civilidade, a polícia tem por função essencial lidar com casos excepcionais de pessoas que por uma razão ou outra simplesmente tem comportamentos agressivos, violentos e pouco empáticos.
Nesse discurso a hipótese é que se estivéssemos em uma nação civilizada o fato da polícia entrar em greve não causaria tamanha desordem. Concordo que o caso no Espírito Santo não é resultado exclusivo da greve da polícia, mas eu diria que não há tal coisa como uma nação absolutamente civilizada.
A vasta não observação das normas na ausência de polícia é um fenômeno que só entendemos percebendo que há segmentos da população que estão tão distantes de nós que eles não mais nos enxergam como um igual. Sua realidade ficou tão longe da nossa, criou-se tanta animosidade e inimizade, que não restou qualquer consideração por parte delas. Entendemos que da maneira como está, a sociedade está rachada ao meio. Basta que se retire o aparato coercitivo do Estado e o que resulta é uma barbárie. E que se a polícia é a única coisa que impede que uma grande parcela da sociedade saia brincando de GTA rua a fora, parece ter algo de muito errado, algo de patológico.
Se considerarmos como patológico, isso significa que ou a humanidade é patológica em si ou então que estamos valorizando negativamente algo que é normal na humanidade. Talvez o que pareça patológico seja apenas algo da condição humana diante de determinadas situações, não porque o humano é mal, o humano não é destrutivo por natureza, por questões biológicas, psicológicas, essenciais.
O humano entra em conflito estando agregado. Quanto mais gente cheio de convicções diversas, mais desarmonia, quanto mais desarmonia mais conflitos e maior a necessidade de um mediador de conflitos, de uma polícia.
Bem, se "civilização" é por definição "comunidade harmoniosa de pessoas" e quanto mais complexa a sociedade menos chance há dela ser mais harmônica, é razoável crer que em grandes e complexos aglomerados sociais seja possível haver uma harmonia que faça possível não haver polícia, sem virar anarquia.
Assim sendo, a exigência de policiamento para amenizar a desordem não é uma "doença social", mas resultado da própria complexidade social.
Podemos pensar que o que acontece no Espírito Santo é uma amostra do que acontece no país, a maior evidência de que estamos vivendo em um sistema de exploração com relações de poder desproporcionais e cruéis, provocando mais desarmonia. E esse sistema precisa ser reestruturado pra ontem, caso contrário, já sabemos, tudo tende a piorar cada vez mais e mais.
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