DIREITO DA PESSOA # OPINIÃO
Há 30 anos, quando os avanços na reprodução assistida começaram a permitir a realização de procedimentos sofisticados, parecia tranquilo imaginar o uso de óvulos ou esperma doados de forma anônima em nome do sonho de ter um filho. E era. Para os pais, representava a solução do problema. No entanto, à época não se imaginou que as crianças geradas dessa forma pudessem manifestar o desejo de conhecer seus outros pais biológicos, o que hoje acontece com muitos filhos da reprodução assistida.
À primeira vista pode parecer estranho ir atrás de quem doou o óvulo ou o esperma. A motivação para fazê-lo, porém, não se resume a mera curiosidade. As crianças geradas através de doação de óvulo ou esperma não sabem qual a influência do pai biológico sobre quem ela é, mas não poder conhecê-lo significa nunca responder a essa dúvida. Mesmo que o jovem sempre tenha tido ciência que foi gerado com esperma doado sofre o dilema que a paternidade desconhecida provoca. A mesma inquietação também costuma acometer filhos de pais que não foram gerados artificialmente mas que da mesma forma têm seus pais no anonimato. O fato é que todos nós um dia paramos para nos fazer perguntas difíceis tipo “Para onde vamos?", e também tem os dias em que nos olhamos no espelho e vem o questionamento “De onde viemos?". E quando nossas origens são complicadas, atormentadas e tristes, geralmente evitamos pensar no assunto.
Há pessoas que passam boa parte da vida tentando entender, até o dia em que, já cansadas, tomam a decisão de deletar essa busca por entendimento e aceitar o fato de que não têm o poder para mudar nada.
Para essas pessoas Dia dos Pais, é um dia que não faz muito sentido. Comemorar ser órfão de pai supostamente vivo é meio macabro, não? O jeito fica sendo deletar esse detalhe e fazer de conta que tá tudo certo.
Filhos de pais invisíveis devem pensar que crianças deveriam ser geradas única e exclusivamente quando duas pessoas estão dispostas a "correr esse risco". Não por "insanidade total ou parcial" ou quando alguém quer ser mãe ou pai independente de qualquer coisa (à moda produção independente). No entanto é o que mais acontece por aí em todos os lugares, por todo o mundo, nas melhores famílias.
Como resultado dessa brincadeira sem graça, filhos órfãos de pais supostamente vivos não conseguem confiar plenamente em ninguém, são predispostos a um desconforto que parece os rodear.
No decorrer dessa trajetória, depois de muitos anos de inquietação, acabam parando de esperar por uma visita surpresa, quem sabe um telefonema ou um milagre desse tipo. Um dia para de doer quando perguntam de quem ele é filho, ou se ele é filho de fulano. Um dia para de fantasiar com uma pessoa que só existe na sua imaginação. Um dia para de procurar o rosto do pai perdido em rostos de desconhecidos pelos quais passa na rua. Um dia aprende a gostar dos traços que herdou de um total estranho. Um dia entende que talvez não haja motivo para querer contato com nada que venha dessa pessoa. E que é melhor não aceitar e nem querer nada que lhe faça relembrar nada disso.
Não tendo remédio, um dia aprendem a compensar de alguma forma a lacuna deixada. Porque o que não tem remédio, remediado está. E a vida segue.
Penso que os pais são como asas. Nascemos com duas asas que devem crescer e nos permitir voar. Quando uma delas não cresce, a tendência é aprender a manter os pés sempre fincados no chão. A parte triste é que muita coisa bonita da vida se perde em meio a todos esses sentimentos, e a parte não triste é a superação que acaba acontecendo, muitas vezes, no decorrer da vida quando buscamos resgatar de alguma maneira nossas perdas, sejam elas quais forem.
Sabemos que ausência paterna durante o desenvolvimento da criança e do adolescente é um tema complexo, e que ela não depende só da presença de um pai que exista apenas fisicamente ou da autenticidade de um exame que atesta uma paternidade, mas parece haver uma necessidade inata de filiação nos seres humanos que ao menos precisa ser esclarecida.
Acho que por tudo isso é DIREITO da pessoa conhecer sua verdade biológica, ou seja, não deveria ser uma escolha da mãe, mas um direito da criança.
Pode parecer irrelevante a figura do pai biológico, mas querendo ou não tem valor afetivo importante. Não mais que o valor do pai socioafetivo, aquele que exerce a função ou papel de pai (pai é quem cria), mas para além dele.
Pode parecer irrelevante a figura do pai biológico, mas querendo ou não tem valor afetivo importante. Não mais que o valor do pai socioafetivo, aquele que exerce a função ou papel de pai (pai é quem cria), mas para além dele.
O video a seguir dimensiona essa questão ausência/presença dos pais na vida dos filhos. Veja:
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