A MORTE DE ALGUMA MANEIRA NOS NIVELA
É curioso como, normalmente, temos tendência a "idolatrar" as pessoas que já morreram. Cansamos de ouvir: "ah depois que morre todo mundo vira santo", como se fosse ruim dar o braço a torcer, como se fosse um mal tentar mudar o olho pelo qual se enxerga a pessoa que faleceu, como se isso fosse algo ruim.
Acho que passa longe disso. Me parece um respiro do tipo "eu sei que você fez muitas coisas que eu não achava legal, que brigamos muito, mas vá lá, você tava dando seus pulos. Era o que tínhamos, cada um tava dando o que tinha pra dar".
É como se admitíssemos que não tivemos serenidade e lucidez para enxergar isso durante a vida. E que a morte do outro nos liberou para amolecer, coisa que, no fundo, desejamos fazer em vida, mas não conseguimos por conta de orgulho, cegueira, raiva etc.
Somos de extremos. A morte de alguma maneira nos nivela e coloca os julgamentos em xeque. Será que vale sustentar a ideia de que alguém precisa cair no nosso agrado para ser respeitada no direito de ser como é?
Talvez com a morte as pessoas se sintam livres da possibilidade de cometer novos "erros" e aí consigam baixar a guarda. Em vida somos covardes para tirar a arma do bolso enquanto o "inimigo" está de pé ameaçando nossa tranquilidade.
Alguém poderia contestar dizendo que o problema não está em humanizar a pessoa. Que o problema está na idolatria repentina causada exclusivamente pela morte. Isso é que causa indignação em alguns.
Desconfio que essa idolatria talvez seja nós mesmos repensando e perdoando nossas próprias fragilidades.
A condição do homem é a finitude ou "memória da morte". É a informação constante de que você vai morrer. Por não sabermos como lidar com essa finitude, quando nos deparamos com o fenômeno morte, sobrevem o estranhamento - estamos vivos e, por isso, um corpo sem vida nos é estranho - e, em muitos casos, a compaixão pelo morto. De forma inconsciente, também experimentamos a admiração por alguém que lutou contra o seu "destino" (destino aqui entendido como a morte em si; salvo exceções, tudo o que fazemos durante nossa existência tem como objetivo nos manter vivos) e perdeu; nos tornamos cúmplices, nos identificamos com a "luta" e a "resistência", nos reconhecemos no morto. Eis porque, governadores, quando mortos, se tornam os melhores governadores da história; porque cantores quando mortos acabam se tornando os melhores cantores da história seja do sertanejo, brega, pop ou rock . Isso, claro, enquanto durarem a catarse e o estranhamento provocados por sua morte.
A morte nos faz perceber como somos frágeis perto dela e que de tudo que construímos durante a vida fica somente as coisas boas, as más (brigas, discussões, desentendimentos) serve para vermos como era pequeno o problema e fácil de se resolver comparado a morte.
A compaixão com que olhamos para aqueles que já morreram deveria se manifestar também em vida!
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