segunda-feira, 10 de agosto de 2015

SONHOS HOLYWOODIANOS # ROMANCE

A VIDA REAL É SEMPRE MAIS INTERESSANTE 



Uma verdade da vida é que, por mais independentes, autênticos e confiantes que nós sejamos, todos nós precisamos de parâmetros. Seja para nos adequar, para nos rebelar, para nos reinventar, sempre precisamos de uma base, um conceito, alguma referência pra usar como ponto de partida.
Para errar, precisamos saber o que é certo. Para acertar, precisamos entender que existe um errado e, para saber o que é bom, precisamos experimentar o ruim. E por aí vai.
Essas referências vêm dos mais diversos lugares, claro. Algumas de muito perto, como você querer cozinhar como sua avó. Por outro lado, algumas podem vir de bem longe, por estarem alojadas no nosso imaginário, por fazerem parte da nossa cultura. Como no cinema. Sejam desenhos, comédias, dramas, filmes de ação ou aventura, a linguagem e a mitologia do cinema acabaram se tornando rapidamente referências presentes em nossas vidas e -- quer admitamos ou não -- influenciam nossa forma de lidar com o mundo. As crianças, por exemplo, acham que ursos são inofensivos porque viram isso na Disney.
Nossa geração está sendo criada e alimentada com sonhos hollywoodianos, seja nos relacionamentos, nos negócios, na forma de encarar os problemas e isso cai por terra na vida real, gerando muitas frustrações para o grande público. Expectativas desleais!
De todos os campos do conhecimento em que o cinema influenciou diretamente a forma como lidamos com o mundo real em nenhum deles isso parece ter acontecido de forma mais nociva do que na área do romance. O cinema foi o responsável por criar padrões de beleza, romance ou mesmo de gosto musical que são apenas inviáveis na vida real.
Eu, é claro, acredito que qualquer um dos seus namoros de colégio foi melhor do que toda a filmografia dos romances de Hollywood, seu namorado é mais charmoso do que aqueles galãs mais famosos desse mundo artístico fabuloso.
Me deixa te explicar porque você e ele são melhores do que qualquer galã e qualquer mocinha. Digamos que seja você homem ou mulher, uma grande parte das suas referências e das suas aspirações, tanto do que você quer ser quanto do que você espera de um parceiro, devem ter vindo dos filmes e também das novelas de TV. Mas se você analisar com calma, se pensar com cuidado, nós somos mais legais do que essas pessoas todas. Somos menos confusos, somos menos exagerados, somos menos propensos à loucuras surreais.
Muitas vezes o que nós valorizamos e até admiramos nesses personagens são qualidades que só fazem sentido num contexto imaginário e na vida real trariam muito mais problemas do que vantagens.
Note a trajetória de qualquer casal do cinema.
Tudo começa com um conflito, certo? Sejam eles de famílias que se odeiam, funcionários de laboratórios rivais, assassinos contratados pra matar o mesmo senador, tudo começa com alguma diferença, algum problema. Então eles tem toda a trajetória do filme pra superar esse conflito, claro. Ignorar a divisão entre as classes, fazer as pazes após uma separação traumática, explicar que o que começou como uma aposta se transformou em amor verdadeiro.
E aí, com essas questões superadas, eles finalmente ficam juntos. E aí o que acontece? Bem aí o filme acaba.
Ou seja, no cinema o ciclo do romance é concluído exatamente no momento em que, na vida real, os relacionamentos começam de verdade. Eles, nunca dormiram de conchinha. Jamais fizeram compras pra um almoço de domingo juntos. E nem nenhuma corridinha de rua durante todo o decorrer do relacionamento.
Isso porque apenas num relacionamento real você tem direito a ter a rotina. Sim, a rotina. O dia bobo sem nenhum compromisso, a noite de pizza sem nada memorável, o final de semana debaixo das cobertas sem absolutamente nenhuma surpresa, as pequenas grandes coisas que te fazem saber que o seu relacionamento é de verdade.
Enfim...
Afinal, seus personagens são melhores, mais humanos, mais centrados, possivelmente menos propensos a reviravoltas trágicas ou absurdas demais.
Seu roteiro pode ser mais criativo, se desenvolver com mais calma, ter todo o tempo do mundo pra chegar onde precisa e não se limitar apenas a três atos -- note como seu namoro ou casamento seria mais confuso se tivesse que seguir ao pé da letra a jornada do herói.
E ainda que talvez a trilha sonora de vez em quando possa deixar algo a desejar, já que na vida real pode sim acontecer do primeiro beijo acontecer ao som de Raça Negra e não The Shins, da próxima vez que você passar diante de uma sala de cinema, da sessão de comédias românticas da locadora ou da categoria “filmes emocionantes com finais animadores ” do Netflix, você pode sorrir sabendo que o que você tem é melhor do que tudo aquilo. 

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